26 abril 2004

stress no hospital

Na passada semana vivi uma daquelas experiências que não se desejam a ninguém. Não, não fui raptado por extraterrestres ou coisa parecida, muito embora haja qualquer coisa de sobrenatural no que me aconteceu.

Presumo que muitos de vós, ou pelo menos alguns, em determinado momento da vossa existência enquanto seres vivos, já devem ter passado por aquilo que a que vou chamar MSSUHP (Momentos de Stress em Salas de Urgência de Hospital Público).

Seja lá porque motivo for, acredito que se trata de um daqueles sítios que ninguém no seu perfeito juízo goste de frequentar. Se vamos ao Serviço de Urgências de um hospital é porque algo não está bem. Se bem que, é bem verdade, também existem os hipocondríacos. Há malucos com gostos para tudo, mas adiante.

Na 5.ª feira, tinha eu acabado de chegar ao meu local de trabalho, quando me telefona a minha Mãe a dizer que o meu Pai não se estava a sentir bem. Queixava-se de fortes dores na zona abdominal. Nem hesitei. “Mãe, vou já para aí e levo o Pai ao hospital.”

Deixei o meu Pai na admissão de doentes do Hospital de Reynaldo dos Santos (Vila Franca de Xira) e fui estacionar o carro. Para meu espanto, quando regresso ao Hospital cinco minutos depois, já o meu Pai tinha passado pela sala de triagem e tinha sido encaminhado para uma das salas para ser observado por um médico.

Eu que tenho uma crónica desconfiança e insegurança no que diz respeito à qualidade daquele serviço, motivado por más experiências anteriores, fui surpreendido com a rapidez com que as coisas se estavam a processar.

Passado um bocado, sai o meu Pai da sala, com a indicação do médico para se dirigir ao piso de baixo, onde iria ser submetido a um RX e a umas análises. Nisto ele entrega-me um autocolante com os dados dele, o qual também continha um traço de cor amarela e um carimbo com a letra A. Tratava-se da minha identificação como sendo seu acompanhante, fazendo a cor amarela parte dos novos esquemas de funcionamento dos serviços de urgência. A cada cor corresponde um nível de urgência.

Até aqui tudo bem. Feita a colheita de sangue para as análises e o RX, dirigimo-nos para a sala de espera das urgências onde ficamos a aguardar que chamassem o meu Pai, algo que sucedeu cerca de duas horas depois. O período de espera foi normal, segundo dizem, uma vez que se trata do tempo necessário para que os resultados das análises ficassem prontos.

A partir daqui é que a porca começa a torcer o rabo. Perto da uma da tarde, o meu Pai é chamado à sala 4. Passada uma hora, não tendo ele ainda saído nem tendo eu sido chamado, comecei a stressar. Ainda para mais, tinha a minha Mãe a telefonar-me constantemente para saber o que se estava a passar, e eu sem novidades para lhe dar.

Dirigi-me ao segurança (sim, junto à porta de acesso para o interior do serviço de urgências estavam dois seguranças de uma empresa privada) e perguntei-lhe porque é que nem o meu Pai saía nem eu era chamado. Porque é que ninguém me informava do que se estava a passar?

A resposta do homem teve tanto de rápida como de vaga. “Provavelmente está à espera de qualquer coisa. Tenha calma e aguarde mais um bocado.” À espera de qualquer coisa?! Importam-se de me definir o que é “qualquer coisa”?! Claro que aquilo que eu mais estava era calmo, ou então não!
Nesta altura já só me passavam coisinhas más pela cabeça. “O que se estará a passar? Porque é que ninguém me diz nada? Será que ele se sentiu mal e foi levado para reanimação ou merda parecida?”.

Depois de mais um telefonema da minha Mãe, que já estava em nítido estado de ansiedade, e uma vez que já eram quase 3 da tarde, não aguentei mais. Deu-me o clique e perdi a paciência.

Fui novamente falar com os seguranças os quais me aconselharam a dirigir-me ao balcão das informações para tentar saber qualquer coisa. Nesse balcão, uma mocinha com um ar muito atarefado, perguntou-me qual era a minha questão.
Depois de lhe ter explicado a situação e ter-lhe perguntado que apenas queria saber o que se estava a passar com o meu Pai, eis que a resposta que obtenho é “Não lhe sei dar essa informação.”

Passei-me. “Não sabe?! Então vá lá dentro de arranje quem saiba. Não estou na disposição de ouvir esse tipo de respostas.” Nesta altura o meu tom de voz já estava bastante alterado. Falava alto mas em momento algum ofendi ou insultei quem quer que fosse. Não que eles não o merecessem. Continuando.

“Se o senhor se acalmar e me disser o nome do seu Pai...”. “Minha senhora, calmo estou eu. Não me queira ver quando eu perder a calma!”.

Dou-lhe o nome, ela tecla qualquer coisa no computador e diz-me “Não consta cá ninguém com esse nome.”

“O quê?!?! Já não basta eu estar há duas horas à espera de notícias e agora diz-me que não consta? Já deram sumiço ao homem?!?!”

A imbecil tinha percebido mal o nome. Porra, apesar de eu estar atacado por uma crise de rinite, não estava assim tão fanhoso que não se percebesse as minhas palavras.

Arranquei o autocolante identificativo e entreguei-o à moça. Ela volta a teclar qualquer coisa e diz-me com um ar triunfante: “Ah, o seu Pai foi fazer análise.”

Resposta errada!. “Ouça, isso já eu sei porque eu estava com ele quando fizeram a colheita! Eu quero saber é onde ele está agora e ou a senhora me diz ou arranje alguém que me saiba dizer. Já agora, não me volte a dizer para ter calma!”

O ambiente já era mais do que tenso e pior ficou quando ela me diz “Se quer saber o que se passa vá lá dentro saber.”

Eu nem queria acreditar no que estava a ouvir. Virei-lhe as costas e avancei para a entrada do serviço. Um dos seguranças barra-me a entrada dizendo-me que eu não estava autorizado a entrar.

Ai a merda. Então para que é que me entregam um autocolante de acompanhante? Não me informam nem me autorizam a entrar! “Se eu não posso entrar então vá lá dentro e veja lá se descobre o que se passa com o meu Pai.”

Sabem qual foi a resposta que ele me deu? De nariz empinado e com o ego cheio pela pose de pseudo agente da autoridade, o tipo vira-se e diz “O senhor está-me a faltar ao respeito.”

Noutra situação o mais certo era ter-me desmanchado a rir, mas naquele momento a resposta saiu-me rápida e eficaz: “Acha que estou? Não posso faltar a algo que não lhe tenho. Realmente vocês vestem essas fardas e ficam logo armados em mauzinhos!”

Valeu nesta altura a intervenção do outro segurança, que demonstrou ser uma pessoa de bom senso. “Eu compreendo a sua situação, mas a verdade é que a nós também não nos informam de nada. Aguarde só um segundo que eu vou ver o que consigo saber.”

Dito e feito. Poucos instantes após este episódio, sou chamado ao interior do serviço. A minha reacção na altura, ao passar pelo balcão de informações e pelos seguranças foi qualquer coisa do estilo “Já devia ter feito barulho há mais tempo!”.

Do outro lado da porta, uma enfermeira com ar de quem estava a fazer um frete, indica-me o local onde o meu Pai estava. Estava sentado numa cadeira, com um frasco de soro, e estava à espera de repetir as análises porque o médico assim o entendeu, embora não lhe tenha justificado porquê.

Uma vez que só ao final da tarde é que lhe iam fazer nova colheita, voltei a Alverca para ir buscar a minha Mãe. Pelo caminho telefonei a uma amiga minha, médica por sinal, tendo-lhe contado o que se estava a passar. Ela pediu-me o nome do meu Pai e disse que ia ligar para o hospital a tentar saber qualquer coisa.

Para meu espanto, meia hora depois, liga-me ela a dizer-me que tinha conseguido falar com o médico que tinha atendido o meu Pai, e que este lhe tinha dito que se tratava de uma infecção no aparelho digestivo, que ele estava estável e medicado e que iam repetir análises apenas para confirmar alguns valores.

Porque é que não me disseram isto a mim assim que ele foi atendido?! Serei assim tão burro que não entendesse essa explicação?! Ao acompanhante do doente nada se diz, mas à colega Doutora diz-se. Indecente, para não dizer algo mais desagradável.

Ao final da tarde voltei ao hospital e, felizmente, desta vez não foi preciso exaltar os ânimos. A funcionária das informações era outra, tendo-se comportado de maneira oposta à sua colega. Expliquei-lhe o que se tinha passado, perguntei-lhe se o meu Pai ainda estava no mesmo sítio ou se já tinha ido fazer análises, e em menos de 5 minutos tinha as respostas. Até o segurança (o simpático, uma vez que o seu colega Rambo já tinha saído), assim que me viu entrar, veio ter comigo para me dizer que tinha visto o meu Pai e que ele estava calmo e com boa cara.

Enfim, é triste dizê-lo, mas a realidade é que os nossos hospitais continuam a falhar naquilo que é o mais básico em situações deste género: falta de informação. Tudo o que sucedeu tinha sido evitado se, assim que o meu Pai foi chamado, me tivessem informado do que se estava a passar.

Só que o nosso sistema de saúde é mesmo assim. Leva-se as pessoas ao extremo para que estas expludam e reajam mal. Como conforto, ainda nos dizem pérolas do género “Se tem alguma reclamação a fazer dirija-se ao gabinete do utente!”. Ainda somos gozados. Não há pachorra.

O meu Pai está em casa e está bem. Isso é aquilo que realmente me importa.

e dei-a





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